Há pouco mais de um ano, no dia do consumidor, destacamos o poder que esta categoria tem sobre os produtores, fornecedores e comerciantes. Talvez ainda pouco consciente sobre sua capacidade de mudar os meios de produção, este lado da balança está cada vez mais organizado em busca de encontrar, nas prateleiras, nas vitrines ou nas garagens, o produto que procura.
Para isso, organizações, governamentais ou não, estão unindo diferentes elos das cadeias produtivas para entender as demandas e estruturar os métodos que vão ao encontro das vontades do mercado.
Recentemente, uma ONG se uniu à Associação Brasileira de Supermercados (Abras) para certificar aos consumidores que a carne comercializada não é proveniente de área de desmatamento ilegal. É claro que para isso chegar lá na ponta, no varejo, todo um trabalho foi desenvolvido ao longo da cadeia de valor, envolvendo indústrias, fornecedores e produtores rurais para implementar serviços de rastreabilidade e o cumprimento de protocolos.
No velho continente, esta semana foram aprovados pacotes de medidas para a PAC (Política Agrícola Comum). Os planos vão disponibilizar quase 400 milhões de euros, sendo grande parte destinada ao financiamento de iniciativas com cunho ambiental, com técnicas mais ecológicas ou com foco no bem-estar animal.
As medidas adotadas pela União Europeia estão alinhadas com a proposta de reduzir ou zerar a importação de produtos que venham de áreas de desmatamento. A proposta, polêmica e mal vista por parte dos países produtores de alimentos, como o Brasil, está em tramitação no parlamento europeu e conta com o apoio de importantes nações como França e Alemanha.
Se por um lado parte dos brasileiros afirma que isso fere a soberania nacional porque desconsidera o Código Florestal, que permite desmatar um percentual das áreas para produção agropecuária. Um outro grupo se organiza para adaptar à nova proposta e usufruir dos recursos que podem vir e dos mercados a serem abertos.
E é aí que pode estar a virada de chave, na organização e proatividade. Quando o varejo se une ao setor produtivo para disponibilizar carne produzida em acordo com a legislação, mostra que não adianta medidas isoladas, normas apartadas do todo, iniciativas individuais. Os elos das cadeias precisam se unir de fato, encontrar meios viáveis de produção, buscar recursos financeiros e chamar o mercado para a mesa de discussão.
O consumidor final sabe o que quer, mas as vezes ele realmente desconhece a realidade dos setores produtivos. Divulgar iniciativas sustentáveis, mostrar as fragilidades existentes, identificar, separar e punir os ilegais, tudo isso tem que fazer parte da estratégia de valorização da produção agroindustrial, dos produtores rurais e do Brasil.
Fechar os olhos, dar as costas e notas de repúdio não adiantam. Precisamos andar de mãos dados com o mercado consumidor, entender o que eles querem e como querem, fazer pesquisa. Se eles não podem nos falar como devemos produzir, também não podemos dizer o que devem comer. Existe o caminho do meio, e ele passa pelo diálogo.
*Luciano Vacari é gestor de agronegócios e diretor da Neo Agro Consultoria e Comunicação